Um Sopro na Nuca - ATO I

Nunca pegava o ônibus no mesmo horário. Era um tanto avesso às rotinas. Ariano, fogo ardente, gostava de meninos, de meninas e dos Rollings Stones. Gostava de observar pessoas. De olhar seus detalhes, os cabelos, as orelhas, as pintas, os volumes todos. De um tempo pra cá, passou a observar mais atentamente as nucas. E os pescoços masculinos... Quanto mais longos, mais lhe chamavam a atenção.

Saiu mais cedo neste dia. Pegou o ônibus das 8h e sentou no banco cativo, no meio. Perdeu os olhos no mar e seguiu viagem. Até que um perfume lhe chamou atenção. E no banco da frente estava a nuca mais bonita que já vira. Comprido, o pescoço guardava uma correntinha de prata, com um santinho jogado pra trás. A regata desenhava os ombros morenos e numa das orelhas havia um pequeno brinquinho, também prateado. Os cabelos negros um pouco ondulados, deixavam restos sobre a nuca.

Olhava extasiado. Queria ver também o rosto, se combinava com o resto. Mas precisava antes de tudo, guardar aquela nuca. Sua respiração não era mais a mesma. Num lampejo, a idéia. Tirou do bolso o celular e fingiu ver qualquer coisa, sem saber direito o que fazer. Não havia ninguém ao seu lado, mas o ônibus estava cheio. Salivava. Sua boca espreitava aquela nuca, queria pendurar-se nela, morde-la inteira, arrancar suspiros.

Desajeitado, enquadrou a nuca na tela e click! O som do celular fez com que o dono da nuca virasse o rosto, revelando perfil. Olhos grandes, sobrancelha vasta e uma boca carnuda... Não se olharam. Um frio na espinha. Olhou o celular: estava lá o vestígio que queria. Poderia se perder naquela nuca quando quisesse e seria capaz de reconhecê-la dentre milhares que visse.

Levantou os olhos. O banco vazio. Pela janela a sua nuca sumia depressa.

...

Quase um mês de expectativa e muitas outras nucas capturadas depois, eis que surge um novo encontro. Quase o mesmo horário, mesmo ônibus. Desta vez, camisa pólo e três bancos à frente.

Não pensou muito. Levantou e foi sentar ao seu lado. Sentou afoito e no esbarrar das pernas trocaram um sorriso.

- Desculpe.
- Nada. Tranqüilo.

Duas palavras. Era muito mais bonito do que revelara o perfil. O brinco prateado estava lá. O cordão não. Alguns cachos lhe escorriam pela testa e a boca, tão carnuda, fez seu pau enrijecer.

- Ta calor né?
- É...
...
- Te vejo descer sempre no Rio Vermelho. Cê trabalha por lá?
Estranhou a pergunta. Os olhos diziam muito.

- Sim - disse sorrindo. Sempre me vê é?

Os olhos riram. Um sim com a cabeça.

- Eu... gosto de sua nuca... dos seus cabelos pretos... fiz até uma foto pra não esquecer.
- Uma foto?
- É... quer ver?

Selecionou no celular a foto. Sabia que o veria novamente.

- Olha...
- Nossa! Você é um louco é? Fica fotografando nuca no ônibus?
- Não – mentiu – só a sua. E olhou bem dentro dos olhos.
...
- Quer descer comigo? Conhecer meu trabalho?
- Sério?
- Sério.

Mordeu a boca. O coração palpitava emotivo.

- O que você faz?
- Sou stripper.
- Ah, não brinca..
- Sério.
...
- Vai dançar só pra mim então? Arriscou.
- Por que não?

Desceram no ponto. Andaram um pouquinho. Entraram na casa escura e ainda vazia.

Não sabia o que fazer... Pediu que esperasse sentado numa cadeira, num salão escuro. Mistura de medo e tesão. Onde ele estava? Alisou de leve o próprio pau. Estava tão duro que sozinho abriria o zíper. Vontade de gozar da porra. Adorava mistérios.

Uma música. Um beijo na nuca. Era ele. E estava semi-nu, com uma cueca minúscula de onça, enfiada na bunda.